O ano é 2025, e parece estranho pensar que nós, mulheres, ainda não conquistamos o mesmo espaço que os homens.
Há pouco mais de um mês, em julho, tivemos um marco histórico: a escritora Ana Maria Gonçalves foi eleita a primeira mulher negra a ocupar a cadeira nº 33 da Academia Brasileira de Letras, com quase unanimidade — 30 votos em 31 possíveis.
Em um país amplamente miscigenado, com uma população negra que representa 56% do Brasil (o maior número de pessoas negras fora do continente africano), demorou 128 anos desde a criação da ABL para que uma mulher negra fosse escolhida.
Sim, um absurdo. Mais de um século de espera. E não podemos esquecer que a primeira mulher a ocupar uma cadeira só foi eleita em 1977 — oitenta anos após a fundação da Academia. Hoje, somos apenas seis mulheres entre quarenta imortais.
Esse atraso não revela apenas o machismo que permeia o meio literário, mas também o quanto esse território foi, por muito tempo, sexista e racializado. Ainda bem que isso está mudando, mesmo que devagar. Afinal, como diz o ditado: “de grão em grão, a galinha enche o papo”.
Vale ressaltar: o “apagamento” de escritoras brilhantes não é exclusividade do Brasil. O mundo inteiro carrega histórias semelhantes.

Quem é Ana Maria Gonçalves?
Nascida em Ibiá (MG), em 1970, Ana Maria começou sua trajetória como publicitária em São Paulo. Mais tarde, ao se mudar para a Bahia, ressignificou sua vida e passou a dedicar-se inteiramente à escrita.
Estreou com Ao lado e à margem do que sentes por mim (2002), escreveu peças de teatro, roteiros, artigos e colunas. Mas foi com Um defeito de cor (2006) que alcançou sua obra-prima — um romance monumental que reconta a história brasileira a partir da perspectiva negra.
Um defeito de cor não é apenas literatura: é um ato de reparação. Um gesto de devolver voz e memória a personagens que a história oficial tentou silenciar. É também a ousadia de colocar no centro da narrativa uma voz feminina e negra, em um país que insiste em marginalizar essas vozes.
Outras vozes que merecem ser ouvidas
Para além de Ana Maria Gonçalves, é urgente prestigiar autoras que iluminam a consciência histórica, a ancestralidade africana e o feminino através das palavras. Aqui vão cinco indicações:
- Conceição Evaristo – Ponciá Vicêncio (2003), Becos da Memória (2006), Olhos d’Água (2014)
- Carolina Maria de Jesus – Quarto de despejo (1960)
- Cristiane Sobral – Não vou lavar os pratos (2010), Só por hoje vou deixar o meu cabelo em paz (2014)
- Djamila Ribeiro – O que é lugar de fala? (2017), Quem tem medo do feminismo negro? (2018)
- Geni Guimarães – A cor da ternura (1989), Leite do peito (1992)
Para quem dedico estas palavras
Este artigo é dedicado a todas as mulheres negras — minhas amigas, colegas de trabalho e todas aquelas que atravessam o dia a dia com uma coragem silenciosa e que são o centro desta reflexão.
Eu vejo vocês.
Estamos juntas.
E a vida ainda nos reserva vitórias lindas.
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