A priori deixe-me contar como adquiri essa obra que decidi resenhar. Entrei em uma certa livraria, lugar de perdição para alguém aficionado por livros, mas que o salário dura apenas algumas dívidas/hora (já consegui pagar 5 dividas por hora, e lá se foi o salário de um mês), a procura de uma boa leitura e barata ao mesmo tempo. Não pense que foi uma tarefa fácil, muito pelo contrário.
Passei em vários setores, aqueles que sempre passamos assim que chegamos na livraria, literatura estrangeira, nacional, policial, infato-juvenil, infantil, best-seller, filosofia, comunicação, direito, engenharia (sim, o desespero começou a bater) e, por fim, a livraria toda. Tive alguns problemas, os livros bons que eu queria eram caros e os livros baratos que eu queria, bem, na verdade eu não queria. E temi pelo pior, escolher entre a certeza de um livro caro, mas que havia a grande possibilidade de ser bom, ou, um livro barato, mas o risco de ser um motivo de agonia.
De qualquer forma meus planos mudaram, porque lembrei de um livro de um escritor que queria muito ler. Queria muito ler o livro “O homem que foi quinta-feira” do G.K. Chesterton, perguntei a atendente sobre o livro e recebi a noticia que não tinha ele. Desolação. Não desisti e perguntei se tinha algum livro do mesmo, para minha sorte haviam duas obras dele. Um custava a vida e o outro estava dentro do meu limitado orçamento.
Graças a isso trago o livro “Tremendas Trivialidades”, do G.K.Chesterton, nesse recapitulando.
Um livro para ler em qualquer lugar!
O livro reúne diversas crônicas de Gilbert Keith Chesterton, que era um ensaísta, novelista, contista, jornalista, poeta e apologista cristão. As cenas descritas no livro são trivialidades (como o nome indica), mas que aos olhos do autor ganham um significado maior e belo.
Nas 39 crônicas do livro o escritor aborda temas como viagens, passeios, taxis, trem, camas, conto de fadas e muitas outras coisas que provavelmente passariam despercebidos no nosso dia a dia, corrido e insano. Chesterton para e observa tudo de uma forma grandiosa, o que faz o leitor desejar ter o mesmo interesse por coisas simples e aparentemente insignificantes. Um trecho que demonstra exatamente o sentimento e intensão do livro esta no final do primeiro texto do cronista, “O mundo nunca sofrerá com a falta de maravilhas, mas apenas com a falta da capacidade de se maravilhar.”
Os temas abordados são de uma leveza surpreendente. Até quando assuntos mais complexos como politica, filosofia, religião e história entram no meio das crônicas ele faz com que o leitor entenda perfeitamente o que o escritor quer dizer. As analogias usadas são simples e de fácil entendimento.
Explicando o motivo dele ser um livro para se ler em qualquer lugar é devido a seus textos curtos e de rápida assimilação. Não entenda essa facilidade como “crônicas burras”, não é isso. Cada trecho mostra todo o potencial intelectual de Chesterton, faz parecer que ninguém poderia tratar daquele assunto como ele tratou. E a sensação que dá ao terminar o livro é de que se acaba de perder um bom amigo.
Mas sem tristeza…
A tradução do livro esta muito boa e concisa. Acredito que o jornalista Chesterton ficaria muito feliz de ver seu inglês bem traduzido. As notas de rodapé explicam exatamente as maiores dificuldade que poderíamos ter na hora de interpretar um texto escrito a décadas atrás, já que a vida do cronista foi de 1874 até 1936.
O fator releitura é um bom ponto. Por se tratarem de crônicas você pode ler e re-ler quantas vezes quiser, e com uma grande chance de ter uma experiencia diferente todas às vezes.
As crônicas que mais gostei
Deixo aqui registrado as crônicas que mais me agradaram, e já digo que será uma tarefa difícil. Gostaria de falar “todas as elas são excelentes e ponto”, mas seria um relaxo da minha parte (mas não mentira, porque de fato tenho esse sentimento bom para com o livro).
Cada descrição feita pelo cronista te faz querer participar da situação. Se ele esta viajando pelos campos de alguma cidade londrina, francesa ou seja lá onde ele estiver, cresce uma vontade de estar no mesmo lugar que é descrito por Chesterton. Se o contista fala sobre giz para pintar algum desenho a vontade é de voltar a ser criança e não ter vergonha de desenhar algo que ninguém vai identificar, mas fará um tremendo bem para a alma. Ou mesmo ficar na cama, sem fazer nada olhando para o teto.
Deixo um trecho da crônica “Sobre ficar na cama”:
“Os avarentos levantam-se cedo pela manhã; e os ladrões, ouvi dizer, levantam-se na noite anterior. O grande perigo de nossa sociedade é que todos os seus mecanismos podem tornar-se cada vez mais fixos, ao passo que seu espírito tornar-se cada vez mais volúvel. As ações e planos de pequena importância de um homem deveriam ser livres, flexíveis, criativos; as coisas que deveriam ser imutáveis são seus princípios, seus ideais. Mas conosco ocorre o contrário: nossas visões mudam constantemente, mas o nosso almoço não muda. Ora, eu gostaria que os homens tivessem conceitos firmes e enraizados, mas quanto ao seu almoço, que o comam às vezes no jardim, às vezes na cama, às vezes no telhado, às vezes no topo de uma árvore. Que discutam a partir dos mesmos princípios fundamentais, quer o façam na cama ou em barco ou em um balão. Este alarmante crescimento de bons hábitos na realidade significa uma ênfase excessiva naquelas virtudes que o mero costume pode adquirir, e muito pouca ênfase naquelas que o costume nunca pode levar a adquirir, repentinas e esplêndidas virtudes de pena ou de candura inspiradas. Se alguma vez formos subitamente solicitados por elas, podemos falhar. Um homem pode habituar-se a levantar às cinco da manhã. Um homem não pode se habituar muito bem a ser queimado por suas opiniões. Prestemos um pouco mais de atenção a estas possibilidades do heroico e do inesperado. Ouso dizer que quando eu sair desta cama terei feito um ato quase tremendo de virtude.”
Sobre o escritor
Gilbert Keith Chesterton nasceu em Londres, no ano de 1874. Irreverente, de bom-humor e eloquente, tinha dois metros e nove centímetros de altura e a um peso médio de 140 quilos, que fazia com que a atenção se voltasse para ele facilmente.
Cronista, Jornalista, contista, ensaísta, novelista, poeta e apologista cristão, Chesterton escreveu mais de 4.000 artigos para jornais, mais de 100 livros e aproximadamente 200 contos. Tem em seu repertório biografias sobre Tomás de Aquino e Francisco de Assis, além do livro O homem que foi quinta-feira(The Man Who Was Thursday) e a série de livros ficcionais que contam as aventuras protagonizadas pelo personagem Padre Brown.
Gilbert Keith Chesterton faleceu em 14 de junho de 1936, em sua residência, na cidade de Beaconsfield (Reino Unido), ao lado de sua esposa Frances Blogg, deixando marcas inesquecíveis em mestres da literatura como Ernest Hemingway, Graham Greene, Jorge Luis Borges, Gabriel García Márquez, Marshall McLuhan, Dorothy L. Sayers, Agatha Christie, Orson Welles e T. S. Eliot, que certa feita afirmou: “Chesterton merece o direito perpétuo a nossa lealdade”.
Ficha catalográfica:
Título: Tremendas Trivialidades
Autor: G.K. Chesterton
Editora: Ecclesiae
Páginas: 248
ISBN: 9788563160218